segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Argentina vs Chile: quem é melhor?

O último texto (“Soy Loco por ti, Argentina” – ver logo abaixo) provocou certa polêmica, e é sempre bom quando os leitores se manifestam mais ativamente. Mesmo se não concordo com os argumentos de um ou outro, ainda assim fico feliz por criar algum burburinho. A possibilidade de interação é o grande barato dos blogs e o que torna esse novo tipo de veículo tão envolvente. Pelo nível dos comentários percebo que tem gente que entende do assunto lendo o Carta de Vinhos. Muitas vezes as informações e experiência que os leitores compartilham é o melhor conteúdo disponível nesta página virtual, muito mais enriquecedor do que eu sozinho poderia oferecer. Ainda bem.

Uma coisa puxa a outra e chego ao post atual, que também é um tema controverso. Então lá vai: que país faz os melhores vinhos da América do Sul atualmente? Não sou dono da verdade, por isso fiquem todos à vontade para opinar. Mas também não vou ficar em cima do muro.

Comecemos pelo óbvio: o Brasil não é. A produção nacional melhorou muito, mas ainda estamos nitidamente engatinhando. O único tipo de vinho em que o Brasil está à frente do resto do continente são os espumantes.

Depois, o Uruguai. Gosto de diversos rótulos uruguaios. O Prelúdio, por exemplo, é ótimo, muito elegante e parece evoluir bem na adega. Contudo, embora tenha simpatia pela produção local, não acho que o troféu deveria ir para o Uruguai. A quantidade de vinhos realmente bons é limitada e a qualidade média ainda poderia melhorar. A uva-símbolo do país, a Tannat, é bem interessante, só que sozinha não faz verão. É preciso desenvolver outras variedades e melhorar os cortes. Recentemente tomei um Pisano Tannat RPF 2002 que confirmou uma impressão que muitas vezes tenho de produtos feitos dessa casta. Mesmo sendo um rótulo relativamente simples, apresentava ótima estrutura e agradeceu os cinco anos de envelhecimento. No entanto, a fruta ficou num tom meio baixo, um pouco desvanecida, tanto que a madeira dominava demais o nariz e a boca.

Por eliminação, chegamos a Chile e Argentina, sem dúvida as grandes potências vinícolas da América do Sul. Seus melhores rótulos são reconhecidos e admirados internacionalmente, enquanto os produtos básicos e intermediários podem ser excelentes custo/benefício. Esses países divididos pela cordilheira dos Andes nutrem uma rivalidade histórica, que agora se repete nos vinhos com toda a força.

E aí, quem é melhor? Vamos por partes.

O Chile começou a revolução da qualidade um pouco antes, lá pelo final da década de 80. A Argentina, quase dez anos depois. Em compensação, o ritmo portenho andou mais ligeiro. É impressionante o salto que Mendoza deu, digamos, entre o que se fazia em 1998 e o que se faz hoje. Foi da zurrapa para o vinho.

Ambos países adotaram uvas francesas que até então ocupavam um papel secundário e elevaram-nas a uma posição de destaque. O Chile foi de Carmenere, uma variedade de Bordeaux que estava quase extinta e foi redescoberta em alguns vinhedos chilenos misturada à Merlot; a Argentina elegeu a Malbec, também francesa e igualmente pouco prestigiada em sua terra natal. Acho que as duas variedades originam, sozinhas ou em cortes, vinhos muito bons e cada qual com um caráter bem particular. Mas, na minha opinião, aqui quem marca ponto são os argentinos. Hoje os vinhos de Malbec são, na média, melhores que os de Carmenere em todos os níveis, desde os produtos básicos até os top. Repito: na média. Há excelentes exemplares de Carmenere e há Malbecs péssimos, monótonos e concentrados demais. Só que temos mais coisas razoáveis de Malbec e, sobretudo, os rótulos superpremium dessa variedade batem a maioria dos superpremium de Carmenere (até porque há poucos; a Carmenere é mais usada em blends mesmo). No Chile, a uva tinta de melhor qualidade ainda é a universal Cabernet Sauvignon.

Em diversidade climática, o Chile leva certa vantagem. O país é aquela tripa estreitinha, mas é comprido à beça (são 4 630 quilômetros de norte a sul e apenas 430 quilômetro entre o ponto mais largo de leste a oeste do país). Isso faz com que passe por muitas latitudes e, conseqüentemente, apresente climas muito diferentes. Há terrenos adequados para praticamente qualquer tipo de uva. De fato, Cabernet Sauvignon, Syrah, Carmenere, Merlot, Pinot Noir, Cariñena, Chardonnay, Riesling e Sauvignon Blanc estão todas gerando rótulos de alto nível no Chile. Até a Malbec vai bem: o Viu Manent Viu 1 é um produto excelente feito com essa casta.

Já a Argentina usa e abusa da plantação em montanhas para que o frio da altitude compense o calor excessivo da semi-desértica Mendoza. É um recurso não só válido como louvável e que está dando resultados. Ainda assim, a maioria das garrafas argentinas é marcada por uma potência e concentração típicas de regiões muito ensolaradas e quentes.

Claro, tudo isso é teoria. O que vale mesmo é na taça, certo? E na taça o Chile ganha por um motivo principal: os bons vinhos chilenos são mais elegantes, mais refinados. Os argentinos podem ser excelentes, mas têm a mão pesada. Isso não é um fato indiscutível. É apenas minha opinião pessoal.

Diversos especialistas respeitados dizem que a Argentina logo, logo, vai superar o Chile – na verdade, muitos acham que já superou. A Argentina tem maiores extensões de áreas cultiváveis, mais recursos financeiros, atraiu investidores e enólogos internacionais de peso e deu um salto inacreditável de qualidade num período curtíssimo. Pode ser. Mas estou falando de hoje. E hoje eu prefiro os vinhos chilenos.

De novo – já que o assunto é polêmico, convém deixar minhas opiniões bem claras – isso é uma média. Muitos rótulos argentinos são absolutamente fantásticos e alguns são inclusive elegantes. Achaval-Ferrer, Cobos, Nicolas Catena Zapata, Cheval des Andes e Iscay, entre alguns outros, são bons demais para o meu gosto. Só que do lado de lá da cordilheira temos Don Melchor, Seña, Viñedo Chadwick, Montes M, Montes Folly, Clos Apalta, Domus Aurea, Casa Real, Almaviva e outros tantos – mesmo linhas intermediárias como a Terrunyo, da Concha y Toro, chegam a um patamar de qualidade bastante elevado no Chile. Para não falar dos brancos, como o ótimo Sol de Sol (chardonnay), para mim o melhor produto dessa uva na América do Sul.

E para você, qual o lado preferido da Cordilheira dos Andes?

17 comentários:

Anônimo disse...

Concordo plenamente. Morei alguns anos no Chile e é impressionamente comparar vinhos da mesma uva em regiões diferentes. Adorava comparar, por exemplo, Syrah's do Limari, Aconcagua, Leyda, Casablanca, Maipo, Colchagua e Curicó. Nem parece a mesma uva! Mas a Argentina tem um diferencial em relação ao Chile: os argentinos (em média) gostam e se interessam muito mais por vinhos do que os chilenos. Isse se reflete no atendimento nos restaurantes, cuidados ao servir, lojas especializadas etc... Isso pode fazer com que em alguns anos a balança se inverta...
PS.1: essa é a percepção de quem conviveu nos dois países. Obviamente não tem validade estatística.
PS.2: parabéns pelo blog! Temas polêmicos enriquecem a conversa, desde que tratados sem fanatismo.

Anônimo disse...

Meu voto também vai para o Chile! Vocês ainda não enjoaram desses Malbecs que parecem geléia?

Luiz Horta disse...

Bom, nesta taça Libertadores eu voto:
Uruguai
Argentina
Chile
(nesta ordem).

Anônimo disse...

Luiz, quais os seus vinhos favoritos do Uruguai que você considera melhores que os top argentinos e chilenos?

Luiz Horta disse...

Tenho uma lista compridinha, o Pisano Axis Mundi, Exte Oneko, RPF Tannat, os Bouza Tannat parcela A6, Monte Vide Eu, Tannat Tempranillo, Marichal Pinot Noir e por ai afora (cito de mémoria). Acho a Tannat no Uruguai dona de uma tipicidade e de uma "ingenuidade" que não é fácil de encontrar. E o país é muito mais versátil que se pensa, uma garrafa de Riesling (renano sim senhor) 1996 (!!!) que tomei nos Pisano me pareceu uma prova disto.

José Luiz disse...

No ano passado, participei de uma degustação, na verdade um painel, conduzida pelo Patricio Tapia. Apesar do calor infernal que estava na feira, deu para refletir um pouco sobre os vinhos, graças ao (fraco) ar condicionado da sala. O Chile se destacou, sobretudo pela elegância. O Uruguai pela curiosidade. Melhores: Domus Aurea e Cipreses.

Vinhos:
- CUÑA DE PIEDRA TANNAT 1996 - Cerros de San Juan (Uruguai)
- FINCA TINTO 2002 - Finca La Anita (Argentina)
- COLOMÉ RESERVA 2003 - Finca Colomé (Argentina)
- NOEMIA MALBEC 2004 - Vinícola Noemia (Argentina)
- DOMUS AUREA 2002 - Clos Quebrada de Macul (Chile)
- CASA REAL 2002 - Viña Santa Rita (Chile)
- DON MELCHOR 2002 - Concha y Toro (Chile)
- CIPRESES 2005 - Casa Marin (Chile)

Anônimo disse...

Separando por categorias a média chilena é superior. E o Ricardo destaca uma característica muito interessante: a diversidade dos terroirs chilenos. Já na Argentina há menor variedade (Mendoza e Salta, quando muito).

Não conheço os vinhos uruguaios o suficiente para comentá-los. Já provei alguns da Pisano: bons, corretos, mas não empolgaram.

Anônimo disse...

Na média também acho os chilenos melhores. Mais elegantes e mais diversos (climas, terrenos, castas...). Também gosto dos Uruguaios, que apresentam ótima tipicidade, e, em geral, teor alcóolico menor do que os chilenos e argentinos. Assim, são mais refinados também.
Confesso que enjoei dos vinhos argentinos, talvez pelo execesso de potência, pelas frutas exuberantes. Mas existem grandes vinhos por lá, certamente.

Só mais uma coisa: o comentário do Adalberto sobre a diferença da "cultura de vinhos" no Chile e na Argentina é pertinente. Realmente os argentinos estão à frente dos chilenos, basta olhar as cartas dos restaurantes, o número de lojas de vinho etc. Mesmo assim, os dos países ficam muito atrás do Brasil no quesito "tratamento do vinho nos restaurantes"mesmo nas casas de alto padrão: temperatura inadequada, taças ue chegam à mesa já servidas, uso excessivo daquela horível máquina de servir doses etc.

Anônimo disse...

Bem, não tenho nem a litragem nem os anos de consumo e estudo da maioria, então vou leve, mas deixem-me dar minha opinião sobre tão polêmico tema.
- Dos clássicos do Chile só tomei o Don Melchor 97, muito bom, mas achei aquém da reputação. Dos Clássicos Argentinos tomei alguns bons e os achei melhores ou, na pior das hipóteses, tão bons quanto. Para mim, empate técnico. A
- Na gama média e baixa, acho que a Argentina dá de dez no Chile, no aspecto quantidade de bons rótulos e produtores, assim como qualidade média e preço mais acessível.
- Diversidade de cortes e elegância, estou com o Luiz e com o Raul, o Uruguai nos traz coisas novas e surpreendentes. Ontem mesmo estive em uma degustação de um pequeno produtor da região de Rochas, que apresentou produtos muito interessantes e criativos fora um 100% Tannat (top de gama) diferenciado.
Resumo da história, tem para todos os gostos e necessidades. Cada país com suas características dependendo do que você busca. O legal mesmo é que o Brasil, mesmo com preços altíssimos, dá de goleada no quesito diversidade (rótulos e países) de vinhos disponíveis e qualidade no trato.

Unknown disse...

Minha preferência - até o presente momento - recai sobre os vinhos da Argentina, seguidos pelo Uruguai e Chile. Digo "até o momento" pois existem muitos produtores a serem descobertos e só posso opinar levando em consideração os que já experimentei. Teve uma época em que os Chilenos estavam na frente mas foram ultrapassados no dia em que experimentei uma garrafa de um bom vinho Argentino (Catena Zapata) e assim vai...como uma corrida de carros, as posições vão se alterando ao longo da temporada...é por isso que o vinho é sem dúvida uma bebida fantástica. Espero que o meu "Ranking" mude muito ao longo deste ano!!!!! Quem sabe até entrando os vinhos do nosso Brasil...vai saber!!!!!

Anônimo disse...

Excelente comentário sobre a cultura de vinhos superior na Argentina do que no Chile. É isso mesmo. O consumo per capita na Argentina parece que é bem maior do que no Chile, inclusive -- tenho de memória algo como quase 30 litros anuais por argentino e cerca de 10 litros anuais para os chilenos. Não sei se esses dados estão precisos, mas creio que é mais ou menos isso. Em relação ao Uruguai, acho que hoje temos lá alguns vinhos muito típicos, com características próprias, que fogem do estilo padronizado internacionalmente. Isso é um pontaço a favor do Uruguai. Mas acho que ainda falta ao país uma amostragem maior de vinhos premium e mais opções boas em faixas baratas para concorrer com os Alamos e Casilleros del Diablo da vida, que são produtos muito bons na faixa dos 30 reais. Em termos de custo, a Argentina leva certa vantagem em relação ao Chile devido aos acordos do Mercosul que livram os vinhos de lá de taxas de importação. Parece que o custo de produção na argentina também é inferior ao do Chile (terra, mão-de-obra e insumos mais baratos). Contudo, os top chilenos e argentinos são vendidos a preços muito semelhantes no Brasil, geralmente entre R$ 300 e R$ 400 para produtos como Achaval-Ferrer, Nicolas Catena Zapata, Cobos (argentinos) e Seña, Don Melchor e Clos Apalta (chilenos).

Anônimo disse...

Achar que o chile possui mais diversidade de "terroir" que a argentina, e que o da argentina se restringe a salta e mendoza é um equívoco! pra começar, mendoza possui terruños distintos entre sí...bem como salta. Dai lembrem-se de SAn Juan e seu Mora NEgra e outros excelentes vinhos (callia e cia). E a patagonia e seus vinhos já destacando-se????????
A patagonia é enorme e temj potencial! em el bolson já existem muitos investimentos.
Agora meu voto: nos tintos empate tecnico entre chile e argentina, Nos brancos o chile ganha, por hora, com folga! o SB da casa matrin são um coisa de doidos, sem contar sol de sol, amelya....Mas.....o chile praticamente não faz espumantes! Já a argentina com seus BAron B, Alguma coisa da nieto senetier...um novo rosado da achaval ferrer! leva fácil.
Em suma, levíssima vantegem chilena no compto geral!

Luiz Horta disse...

Concordo com o Léo, a diversidade de terroirs na Argentina é grande. Os Syrahs de San Juan estão crescendo muito, tem toda razão. O PN vai melhorar em Neuquen, tem Petit Verdot bom em La Rioja, tem todos os climats de Mendoza.
Ricardo, vc levantou um ponto importante com relação ao consumo interno. O Chile não tem um consumo alto per capita, o mercado é predominantemente de exportação. A Argentina sim e o Uruguai tem o maior consumo per capita do continente, segundo as nossas estatísticas sempre um pouco tremelicantes.

Anônimo disse...

Olá Ricardo,
Será que precisamos definir quem é melhor? Lendo o seu post "espírito da coisa" acredito que a cada garrafa degustada o seu voto pode mudar. Deveríamos torcer para haver um grande empate técnico no topo do ranking entre Argentina, Chile, Uruguay, Brasil.....
Abs.,

Anônimo disse...

Carlos, precisar, não precisamos. Mas é apenas um exercício que estou propondo para discutir que país do nosso continente está mais avançado em vinicultura de qualidade. O assunto é complexo e envolve muitas variáveis -- talvez o Uruguai esteja na frente em tipicidade e caráter próprio; a Argentina em custo/benefício e para quem gosta de vinhos exuberantes; o Chile em elegância. Por sorte, podemos beber bons rótulos de todos esses países e aproveitar o melhor de cada um. Mas a discussão é válida justamente para vermos quem está acertando e quem está errando em cada aspecto dos muitos envolvidos no processo de se fazer bons vinhos.

Anônimo disse...

Olá,

Ganhei um vinho e gostaria de saber algumas caracteristicas dele. Se é um vinho bom ou nao?

Antiguas Estancias. Cabernet Sauvignon. Canelones, 2006, Uruguai.

Obrigada!!

Guillermo disse...

Diversidade climatica ganha chile??? Cara se informa que esta falando merda mesmo, Argentina tem todos os climas, e os vinhos premiados em Italia e Franca... chile apenas sementam as uvas do lado da Argentina, entao, o merito ainda é da Argentina... Se informa antes de falar porque ta repasando merda mesmo